O mix de diversidade apropriado para empresas do futuro
Terceiro e último artigo da série do GT Conselho do Futuro fala sobre como escolher um conselho que represente
Nos dois artigos anteriores desta série – o primeiro sobre macrotendência e o segundo sobre o papel do conselho– mostramos que as premissas objetivas básicas para as organizações do futuro abraçarem a inclusão da diversidade estarão presentes – e até mais consolidadas – nos próximos anos/décadas. Esclarecemos também que esta inclusão não pode se limitar ao conselho e corpo diretivo, mas deve permear a organização como um todo para ser uma inclusão de sucesso, sendo que o conselho, por meio do seu exemplo e ação, deve promover essa mudança cultural na empresa.
Neste terceiro artigo, último da série, buscamos dar algumas recomendações para que a organização diversa e inclusiva possa compor seu board seguindo critérios objetivos. Cumpre lembrar que este é um assunto em constante discussão e não existem ainda regras consolidadas. Restringimos nossos comentários aqui ao Conselho de Administração, apesar de termos afirmado que é importante que a organização abrace a diversidade como conceito, porque, como já dito várias vezes: “O tom vem do topo”.
É importante frisar que, verificadas as premissas desenvolvidas nos artigos anteriores, neste ponto do conselho do futuro a inclusão de diversidade passará a ser um objetivo estratégico da organização, a ser considerado junto às competências técnicas e comportamentais requeridas para o exercício da função. Provavelmente, no procedimento de escolha de candidato para o conselho, será normal um trade-off que se caracteriza em uma ação econômica que visa à resolução de problema, mas acarreta outro, obrigando uma escolha. Ocorre quando se renuncia a algum bem ou serviço distinto para se obter outro bem ou serviço distinto. Assim, entre as várias competências, a caraterística de ser diverso terá um peso – que dependerá do momento e do estágio de maturidade para com o tema de cada empresa.
Os fatores a se considerar na formação desse Conselho “diverso”, uma vez que a empresa decida iniciar essa jornada, a nosso ver são os seguintes:
1) Não existe dúvida de que a inclusão da diversidade tem muito a ver com o tratamento digno de grupos minoritários e com o respeito às profissões. Nesse sentido, existe um profundo significado ético na incorporação de políticas de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI) na empresa. Importante lembrar que o principal dever dos dirigentes é para com os seus stakeholders de forma equilibrada, portanto, devem tomar o devido cuidado para que uma política de DEI sem muito planejamento, precipitada ou elaborada por simples “modismo”, acabe prejudicando a empresa no curto prazo, desmoralizando até o próprio conceito de diversidade na organização e frente aos stakeholders. No futuro ficará claro que empresas que tenham usado do diversity washing e do tokenismo para tentar aproveitar a “moda da diversidade”, terão prejudicado não só a sua reputação, mas também, como consequência, a de todos seus stakeholders e eventualmente outras empresas que levaram a sério os programas de diversidade e inclusão. Vale lembrar que diversity washing é um termo criado por Liliane Rocha (consultora em D&I) com base no conceito de greenwashing, para identificar práticas ou ações de empresas, governos e outras instituições que se apropriam de questões relacionadas à temática para ganharem posicionamento em marketing e comunicação, sem que de fato, realizem ações concretas para a inclusão da diversidade. Enquanto isso tokenismo é a prática de fazer apenas um esforço superficial ou simbólico para ser inclusivo para membros de minoria, especialmente recrutando um pequeno número de pessoas de grupos sub-representados para dar a aparência de igualdade racial, ou de outros pilares de D&I, dentro das empresas.
2) Cada organização tem a sua realidade que em parte a faz única; a maior velocidade na introdução da diversidade no Conselho dependerá de algumas questões prévias:
*A empresa que opera na “linha de frente” do mercado, mais perto do consumidor, precisa entender claramente as tendências e preferências, prever as necessidades (até mesmo antes que o consumidor as exprima) e definir uma estratégia de pricing (precificação) adequada ao seu mercado atual e futuro. Incluir diversidade representativa desses mercados no Conselho de Administração ajuda certamente a formular estratégias de menor risco e maior impacto. Empresas situadas perto do início da cadeia produtiva – sobretudo nos segmentos industriais – também precisarão incluir diversidade que aportem conhecimento tecnológico e que consigam enxergar através da cadeia de valor os possíveis movimentos da indústria como um todo, como: diversidade de faixa etária, especialização profissional, gênero, serão importantes para estes segmentos.
*Deverão ser evitados os “pretextos” para impedir ou procrastinar a inclusão de diversidade no Conselho. Sobretudo porque tais pretextos são normalmente identificáveis como tais pela população da empresa e pelos analistas do mercado, e isto pode ensejar consequências negativas. Dito isso, porém, também é verdade que as empresas apresentam diferentes urgências e estabelecem as prioridades daquele momento. O importante é que a empresa, no momento em que se sentir preparada e disposta a abraçar de forma genuína a inclusão da diversidade em seu Conselho, esteja aberta para fazê-lo com a profundidade necessária para que não sejam apenas ações pontuais que não geram valor à longo prazo para a organização e demais stakeholders.
*As empresas têm legados, sobretudo quando são empresas de sucesso. Modelos de decisão característicos da organização podem ser alterados e podem produzir hesitações ou longas discussões, quando novos membros, com visões muito diversas, são incorporados ao board. Importante será realizar a reconstrução do conselho em forma paulatina e não radical. Portanto, olhando para o futuro de forma estratégica, será imprescindível enxergar as transformações econômicas e os anseios sociais que, a partir de novas perspectivas, de alguma forma impactaram no modelo de negócios da organização.
3) Para cada necessidade e momento, existe uma diversidade de competências possíveis. O Conselho é um órgão colegiado restrito e a média de membros é de 7 a 9 conselheiros. Portanto, é impossível incluir toda a diversidade desejada na composição do Conselho. Faz-se necessário estabelecer um conceito que deve ser claro: no processo de seleção de conselheiro para composição de um Conselho diverso, é preciso considerar que diversidade no conselho é e será primordialmente um tema de inclusão via “não exclusão”. Ou seja, definida a estratégia de diversidade que se pretende implementar, aquela considerada necessária para atingir os objetivos da organização, deve-se incorporá-la sem nenhuma posição prévia de preferência, nem de exclusão por preconceito. Isto deve ser parte da nova cultura para toda a organização, e certamente para o Conselho de Administração.
4) Para ajudar na identificação das diversidades “necessárias” que deverão compor o mix do Conselho de Administração, podemos fazer uma primeira grande classificação em dois critérios:
- a) Diversidades consideradas essenciais para a estratégia da empresa. Exemplos: diversidade geracional, tecnológica, de origem social, de especificidades profissionais do negócio, de conhecimentos específicos dos mercados de atuação, etc.
- b) Interseccionalidades às anteriores, que podem ser também críticas em alguns casos, e que atendem mais aos aspectos éticos do conceito. Exemplos: diversidade de gênero, de raça, de orientação sexual, de religião, de pessoas com deficiência (PcDs), etc.
Na seleção de candidatos a membros do Conselho de Administração, é muito importante que, uma vez definida a diversidade essencial (tipo A) necessária para ajudar a desenvolver a estratégia de crescimento da empresa, não exista nenhum fator inibidor para as interseccionalidades (tipo B). Esse processo de escolha refletirá a verdadeira aplicação do princípio de inclusão também via “não exclusão” acima mencionado, mantendo as vantagens competitivas que farão da empresa uma empresa com propósito, aumentando as suas chances de sucesso e perenidade.
Leia também os outros dois artigos da série:
O papel do conselho de administração do futuro para criar a cultura de empresa inclusiva
Macrotendência: inclusão de diversidades no conselho de administração
Autores: Alberto Messano e Gabriela Blanchet, integrantes da Comissão Conselho do futuro do IBGC.